domingo, 31 de outubro de 2010

hugs aren't free

abraça-me meu amor, abraça-me por todos os dias em que te foste embora e por todos os dias em que me vais deixar sozinha. abraça-me por todos os nossos momentos que não aconteceram e por aquelas palavras que calaste na tua garganta. abraça-me bem. abraça-me a toda a hora, em todo o lugar, de todas as formas e feitios, mas abraça-me. abraça-me para me deixares feliz, para eu sentir que estás comigo, para eu sentir que me amas. abraça-me enquanto choro, enquanto rio, enquanto durmo, enquanto estou zangada, que eu prometo que também o faço.
abraça-me no meio da chuva, à beira-mar, dentro do carro, debaixo dos lençóis, no meio do supermercado, na última fila da sala de cinema. abraça-me para eu sentir que existes, para eu te abraçar também, para te encaracolar o cabelo, para te tocar no pescoço, para te apertar contra mim. abraça-me...
abraça-me e eu saberei tudo. abraça-me e eu sentirei tudo. sei lá, abraça-me. abraças-me?
enquanto eu estiver a vangloriar a chuva à janela, abraça-me. enquanto estiver a ver a telenovela, abraça-me. enquanto estiver a ler, abraça-me. e quando quiser estar sozinha, não me abraces apenas. abraça-me e diz que me amas.
os teus abraços são a coisa mais preciosa do mundo, e será que todas estas coisas serão desperdiçá-los? não. apenas aproveitá-los o mais que posso.
por isso, abraça-me.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

true life

foste-me roubando bocados conforme o tempo ia passando. não pedias autorização, muito menos pedias desculpa depois de tal. tinha-se tornado uma rotina. tu tiravas, usufruías e ias-te embora logo a seguir. podia-se dizer que me estava a habituar a esta vida em que o único significado era dar-te toda a minha alma de todas as vezes que me vinhas tocar à campainha.
à noite, a única forma que eu arranjava para adormecer era meter a cabeça debaixo da almofada, quase sem ter por onde respirar e colar os meus olhos fechados à tua imagem, que parecia desfocada no meio das lágrimas. apenas agarrava-me à ideia de que um dia ias querer mais do que a minha alma... acreditava que um dia poderias pedir-me o meu coração. e eu não pediria nada em troca. a tua posse sobre ele bastava-me. adormecia sempre com estes pensamentos e acordava com os teus olhos sobre o meu corpo. não me amavas, era certo. eu sentia no teu olhar muita coisa, mas amor não era. era algo diferente, estranho... algo sem nome. às vezes não percebia bem o que querias de mim. porquê eu? porquê os meus sentimentos? tu não os aproveitavas. pelo contrário: tu desaproveitava-los. usava-los da mesma forma que os ricos comem pão, deixam côdea, deixam miolo - mal aproveitam o que têm. e tu fazes o mesmo comigo. como se eu fosse um passatempo grátis, ou algo parecido. mas ainda assim, não sabendo muito bem porquê, amava-te. completamente. o amor é mais que cego: é estúpido, por vezes.
as décadas passavam e as rugas foram-se apoderando da minha face e de todas as partes do meu coração que a cada dia que passava parecia mais uma ameixa seca que um verdadeiro coração. estava fraco, e parecia demorar horas entre cada palpite. deixei de ter forme e sede, deixei de conseguir escrever com a minha caneta de pena. deixei todos os meus poucos passatempos para passar o tempo a ir ter contigo. agora estavas mais longe... mas ainda assim não deixavas de me visitar todas as meias-noites para tirar o pouco de mim que eu própria tinha. e vou-te contar um segredo: às vezes aproveitava os meus únicos amigos pequeninos e redondinhos para poder ir ter contigo. era só pô-los na língua e pronto, já estava. rápido e eficaz.
uma manhã como todas as outras - tirando o facto que sentia enormes calores dentro de mim e estava um frio de fazer tremer os cabelos, e que não conseguia ouvir o ruído da televisão - saí de casa e caminhei sempre em frente. devo ter demorado cerca de meia hora, mas pareceram-me ter passado dias e dias. se não fosse a bengala a amparar-me os ossos, teria caído no meio da rua umas quantas vezes. entrei por entre um sítio que já não me era estranho mas sim mais que conhecido. sentia-me no reino das trevas. estava tudo coberto por muralhas e estátuas estranhas que me amedrontavam. recompus os óculos com máxima graduação possível que até me pesavam a cabeça, e continuei o meu caminho entre aqueles carreiros que pareciam infinitos. depois, ao fundo, vi-te. não corporalmente, mas vi a tua fotografia. como sempre, o trapo velho que tenho no lado esquerdo do meu peito começou a bater depressa e mais depressa. quanto mais me aproximava, mais ele teimava em sair-me pela boca. e atrás dele sairiam todas as minhas entranhas, tudo de uma só vez. por fim parei, e senti a tua presença. sabia que estavas ali. tanto as tuas cinzas, como tu próprio. a tua alma passava pelo meu corpo para me avisar de que estavas ali, mesmo ao meu lado, e que precisavas de mim. deixei o meu corpo cair sem qualquer cuidado. olhei para a tua fotografia, para o teu nome, e finalmente percebi que a vida não fazia o menor sentido. mas eu tinha vontade de viver, mesmo assim. queria viver para quando pousasse os meus pés no meio das nuvens da minha mente pudesse dançar contigo até ao nascer do sol. era feliz assim. mas tinha saudades tuas. não é que enquanto estivesses cá falássemos ou coisas assim. como já disse, o amor às vezes é estúpido. apenas te amava e amo... sem mais nem para quê. enquanto tinha estes pensamentos que mais pareciam de uma adolescente senti um murro no estômago seguido de um espasmo. senti choques eléctricos desde as pontas dos pés até acima do joelho. parecia que os meus olhos vibravam, e ouvia um irritante pi no meus ouvidos. não parava. as lágrimas começaram a escorrer-me nos olhos, e o sangue começou a aparecer. quando dei por ele, já encharcava toda a minha roupa. não percebi muito bem de onde ele vinha, mas apercebi-me do que estava a acontecer. o meu corpo não aguentava mais a força da minha alma. e eu tinha de ir... havia algo dentro de mim que dizia que tinha de ser assim. não poderia viver naquela angústia feliz para sempre.
minutos depois, revi o meu corpo: estava a modos que ajoelhada na tua campa, uma mão a segurar uma tulipa que ia pôr ao lado da tua fotografia, e a outra a agarrar o pescoço. os olhos estavam abertos, e o verde deles tornara-se pálido e sem vida. já não ouvia o meu coração. mas ouvi uma coisa... a tua voz. nunca te tinha ouvido falar, mas sabia bem ser a tua.
e chamava por mim.


quinta-feira, 21 de outubro de 2010

who am I?

«Usamos os espelhos para ver o rosto e a arte para ver a alma.»
George Bernard Shaw

como não sabia o que escrever, e como decidi deixar o desafio das cartas em standby, pus-me a procurar frases.
esta cativou-me.
todas as manhãs uma das primeiras coisas que fazemos é olhar para o espelho: ver se o cabelo está bem, tentar tapar as olheiras se as tivermos, tentar tapar os defeitos e outras tantas coisas. tenho de admitir que às vezes não olho para o espelho, esqueço-me até que tenho a possibilidade de fazer isso. os espelhos não servem para muito mais que isso, aparentemente. mas precisamos de os ver de outra forma, precisamos de olhar para eles como se não fossem uns simples objectos nos quais conseguimos ver-nos a nós próprios. se olharmos para bem lá no fundo, bem bem lá no fundo, somos capazes de nos encontrarmos de outra forma. damos conta dos nossos sentimentos no espelho. se eles reflectem os nossos olhos, a nossa boca, o nosso nariz, a nossa cabeça, o nosso pescoço e o resto do nosso corpo, não era lógico que reflectissem outras coisas que tais? enquanto olho através dos meus próprios olhos vejo a minha vida passar-me na retina. os momentos vão passando como se os estivesse a ver num filme mudo, e fico com uma enorme vontade de saltar para dentro do meu próprio corpo; apetece-me ser engolida pela magia que o espelho transmite sem desdém. parece fácil demais porque está perto demais. as memórias estão sempre escondidas no cantinho mais aconchegado do nosso ente, onde seja difícil de chegar. as mais poeirentas são de alcance quase impossível, e por isso às vezes só nos apetece chorar por temo-las perdido, quando isso não é verdade. nós não nos esquecemos de nada: as coisas vão sendo sugadas até quase desaparecerem. por isso então, o espelho serve para ver o rosto e o que temos por detrás do nosso rosto.
não se costuma dizer que os artistas revêem-se nas suas obras? então é isso mesmo que a segunda parte desta frase quer dizer. qualquer que seja o tipo de arte, tem sempre um todo de quem construiu. se não tivesse um eu não poderia ser considerada arte, porque não teria essência alguma. a arte pode ser qualquer coisa e pode ser feita por qualquer coisa também, desde que se reconheça um quem nela. se alguma vez quiserem saber como alguém é, dirijam-se à obra de arte mais próxima que possam encontrar dessa pessoa. assim não precisarão de perguntar à própria como ela é - por vezes nem sabemos explicar como somos, não é verdade? -, basta usarem o olhar e o coração, e perceberão tudo de uma forma clara.

para se reconhecerem a vós próprios peguem num espelho e olhem-se;
mas logo a seguir façam o que mais gostarem, porque isso é a vossa arte.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

letter number 21: to someone that I judged at my first impression

quem és tu? não conheço a pessoa em que te tornaste.
num dia amamo-nos mutuamente, quase somos irmãs. no outro o ódio irrompe-te pelas veias, não deixando um pedacinho sequer de boa vontade. nada de ti agora me vê como alguém em quem... não, melhor: nada em ti me vê como alguém. para ti sou absolutamente nada, e acho que não mereço isso. mas também sei que agora nada do que escrevo te interessa, nada do que escrevo dará algum resultado (e se der, não será dos melhores, mas enfim).
só quero que saibas que continuo a gostar muito de ti, mas um dia destes deixo de desculpar cada onda de raiva que tens por mim. não é que eu tenha realmente de desculpar, mas vou deixando passar em branco, como se nada tivesse acontecido. já não falamos à algum tempo, e eu sinto saudades tuas. mas isso também não me vale de nada. a única que coisa que me faz sentir é que sou uma fraca. em vez de fazer frente à realidade, vou-me lembrando do passado... naquele passado não tão longínquo em que estávamos perfeitamente uma com outra. unha e carne. e agora o que somos? para ti sou uma estranha. para mim, continuas a ser uma amiga. a única diferença é que já não é mútuo.
mas repito: eu agora não te reconheço. continuas a ter o mesmo nome, ou também o mudaste como te mudaste para comigo? tornaste-te numa desconhecida, a quem não vejo nenhum traço da antiga que conhecia. tu não te enquadras em quem és hoje! para onde foste? porque não te mostras? antes, achava-te uma pessoa fantástica, insubstituível, alguém de outro mundo. e agora? (...) não sei quem és tu, nunca te vi. será que sempre foste assim mas eu nunca notei? talvez seja só para quem odeias.
não sei bem porquê, não tenho provas, não tenho razões. mas sinto que lá no fundo, bem lá no fundo, ainda gostas de mim. sabes que às vezes desculpar faz-nos bem? desculpar sem mais nem para quê. simplesmente desculpar, e deitar o resto para trás das costas. eu ainda não aprendi a fazer isso, admito. talvez um dia o consiga fazer. e tu também.

domingo, 17 de outubro de 2010

letter number 20: to the one that broke my heart

o sentimento que nutro por ti faz-me sentir completa. contigo sinto que sou capaz de ultrapassar todas as coisas que me apareçam, sinto que sou capaz de enfrentar tempestades e até o fim do mundo; se estivermos de mãos dadas tenho a certeza que iremos para onde nos apetecer, basta querermos! porque juntos somos mais fortes que qualquer outra coisa. não partilhas da mesma opinião que eu? sei que um dos lados do meu coração foi parte arrancada do teu, e que uma parte do teu coração é do meu. e porquê? porque parece que fomos feitos um para o outro. parece, só isso...
o destino decidiu não nos pôr frente a frente todos os dias para que todas estas coisas fossem comprovadas. achou melhor que o teu sentimento por mim não fosse realmente gémeo do meu sentimento por ti. apesar de tudo, sei que gostavas que eles fossem os mesmos. amas-me como uma irmã que não tens. amas-me com tudo o que tens. amas-me mais que muitas outras pessoas. e eu amo-te a ti, meu pequeno príncipe.
milhares e milhares de quilómetros e um imenso oceano que agora nos separam não são nem nunca serão suficientes para quebrar a ligação invisível mas indestrutível que paira sobre nós. não são meros contratempos que nos irão afastar. nós somos mais do que isso: duas pessoas que gostam uma da outra. nós precisamos um do outro. sim, essa é a grande diferença entre nós e outros tantos. poderia não existir nenhum outro sentimento paralelo à necessidade, que tudo seria o mesmo.
mas esta carta não é para ti. esta carta é para o meu sentimento por ti, que, como o destinatário indica, já me partiu muitas vezes o órgão propulsor em pequenos pedacinhos de vidro ensanguentados. como outrora escrevi num dos meus textos escondidos, o amor dá-nos cabo das entranhas, e posso dizer que sou prova viva disso. às vezes o amor deixa-nos maiores sequelas do que levarmos com um balde de ácido em cima. corrói-nos, dá-nos vontade de morrer, faz-nos sentir uns velhos trapos sem utilidade nenhuma, rouba tudo o que há de bom em nós. há pior que um sentimento sem uma peça do puzzle onde encaixar? há algo mais extenuante do que pensar que a pessoa que mais amamos no mundo não é a peça que coincide connosco? talvez com o tempo possa ser. mas naquele preciso momento, em que desejamos que tudo se concentre ali, não dá. não é certo. porque é que quem quer que seja que comanda esta maldita vida não fez uns botõezinhos em todos nós para pudermos clicar e fazer com que nos amem?
mas não te culpes, meu amor. não podes ser obrigado a amar-me, não é? e o sentimento que tens por mim tem de me bastar, porque ainda é o que me faz querer viver. e saber que um dia vamos voltar a abraçar-nos dá-me razões para continuar a deixar que o meu coração desfeito em pó seja purificado pelo sangue que circula no meu corpo. no meu estúpido corpo que mais parece corpo de defunto por sentir demasiado a tua falta.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

letter number 19: to someone that pesters my mind

levas-me a pensar que não tenho o direito que existas, e quanto mais ter o direito de ser feliz enquanto perduras.
dás-me voltas à cabeça, e do meu cérebro fazes um nó.
achas que podes andar sempre a fazer-me isso? destroças-me mais a cada dia que passa por seres tão injusta, por levares o rumo que levas, e roubares-me o que mais amo. ofereces-me novas oportunidades, mas também mas tiras. tanto estás do meu lado, como contra mim. já reparaste que o que me fazes não se deve fazer a ninguém? mas também sei que não tens culpa, que apenas fazes o que te mandam, e que segues o futuro (à risca). mas porque é que por vezes não foges à regra a meu favor? não te custa nada fazeres quem te faz existir mais feliz de vez em quando...
mas, repito, és das coisas mais injustas que conheço. dás-me algo, fazes-me amar o que me dás, viver do que me dás, sonhar com o que me dás, querer mais e mais do que me dás; e do nada, tiras-me esse tudo. leva-lo para longe. mas sabes no que ainda acredito? que no futuro voltas-mo a devolver - inteirinho - e pronto para lutar comigo contra tudo e todos. penso que apenas me fizeste isto para te viver de outra forma (não tão boa como a anterior e a que virá) e me preparar para enfrentar tudo o que for preciso para ter direito ao meu futuro. talvez nesse dia tu me faças feliz, minha querida destinatária.
mas peço-te uma coisa: vê se me dás uns doces de vez em quando, uns reconfortos. algo que me faça querer que existas. porque um dia destes... não sei o que será. talvez te ponha fim? talvez me veja livre de ti? vai dar tudo ao mesmo. mas se não queres desaparecer junto dos átomos que me compõem, porta-te bem. ou então diz-me porque não te portas, para que eu possa mudar o que faço mal e assim possamos as duas ficar de bem uma com a outra.
a tua fonte de existência própria está longe, mas a tua - minha - alma grita e gritará por ela para sempre. é mais do que automático. não é preciso carregar em nenhum botão nem ligar à electricidade. é involuntário e único. mas agora teremos, ou melhor, terás de continuar esse teu rumo, para que daqui a uns tempos voltemos a cruzar-nos com o que mais amamos. deixemo-nos de preocupações! ainda és nova, pouco exististe, apenas faz-me aproveitar-te.
mas prometo que no fim tudo será como já te disse tantas vezes.

para a minha vida.

domingo, 10 de outubro de 2010

letter number 18: to someone I wish I could be

estava no meio da rua, sentada numa cadeira de praia à chuva; mas ao mesmo tempo estava no cume de uma montanha a sentir o mar acariciar-lhe os pés.
tinha um papel na mão e escrevia, não sei do que se tratava, mas uma coisa em que eu reparei é que no meio daquela chuva o papel não se molhava, e o vento do cume da montanha não o roubava.
o cabelo castanho escuro chegava-lhe ao fundo das costas, os olhos verdes deleitavam com a chuva, e o barulho da dor era confundido com o barulho da chuva a cair sobre os telhados das casas que estavam por perto. tinha a pele branca como neve e a sua suavidade notava-se ao longe. tinha um brilho inconfundível no seu próprio ser, que é impossível de explicar. quando os seus lábios se entreabriam ouvia-se uma melodia perfeita, mas ao mesmo tempo capaz de cortar cabeças. tinha uma voz forte, e o seu olhar era doce, inocente... mas ao mesmo tempo feroz. as suas pestanas eram enormes, escuras e faziam lembrar pestanas de boneca de porcelana. mesmo à distância a que estava dela, e sabendo que eu lhe era invisível, sentia o seu poder sobre qualquer corpo que passasse. o seu cheiro a morangos entranhava-se-me nos poros, e fiquei com uma enorme vontade de ler a que tanto aquela rapariga se entregava no papel. de repente, como se me visse, levantou-se. olhou na minha direcção, mas eu percebi que nada via além do mesmo de sempre: um céu escuro, sem estrelas nem a lua. embrulhou o papel numa bola, esticou a mão direita e soprou-o. como se fosse para mim... e desapareceu. senti algo na minha mão. que magia era aquela? desembrulhei aquele papel amachucado com aspecto antigo e este encontrava-se em branco, mas depois de piscar os olhos vi as palavras aparecerem-me à frente conforme eu as ia lendo, palavra a palavra.
sei que não sabes o meu nome. mas eu também não sei o teu; só sei que quero que saibas que tu és eu. ou melhor, eu sou tu daqui a muito, muito tempo. mas não te aflijas. nada disto é fora do normal. toda a gente conseguirá ser quem quer, e tu não serás excepção, minha alma vagabunda. terás coragem para enfrentar mil e um animais ferozes, portanto, também terás coragem para seguir com a tua vida em frente e fazer e dizer coisas que nunca pensaste que serias capaz. a tua paciência não terá limite, os teus sonhos vão aparecer, e a tua felicidade também. já sei sobre o que te estás a perguntar agora, meu pequeno eu. e a resposta que tenho a dar-te é que sim, a tua inspiração será maior que a de todos os poetas conhecidos do mundo. terás vontade de despejar os teus pensamentos no papel a todo o momento. mas terás de ter cuidado nas tuas escolhas, o mundo do futuro não é fácil e foi e será muito difícil chegar onde estamos agora. simplesmente deixa-te viver, com as tuas normais preocupações. a tua consciência tratará de te avisar quando o cuidado tiver de trabalhar no teu pensamento. voltando ao mesmo assunto: a tua simpatia será contagiante, o teu coração baterá mais do que os de mil homens apaixonados pelas suas damas, a tua leveza será angelical e o teu carinho nunca desaparecerá. para já, sê quem tu és e deixa o resto com as horas que passarem.
até breve.

então - devo perguntar-me agora - a perfeição existe? não é que esta descrição seja realmente a perfeição, mas para mim basta-me. basta-me tudo isto que não é muito, mas que também não é pouco. a única coisa que posso fazer é sentar-me numa cadeira de praia à chuva e deixar que a terra absorva as minhas lágrimas... ou então escalar a montanha mais próxima e deixar que os meus pés brinquem com a água do mar. ou, sei lá. deixar-me levar pelo tempo e passá-lo a olhar para o meu relógio de pulso: não posso fazer batota, por isso não o devo adiantar. o tempo que todos vivemos já é pouco, por isso seria um erro da minha sanidade fazê-lo. resta esperar, esperar...

e esta carta foi dirigida a mim própria... mas um pouco diferente.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

letter number 17: to someone from my childhood

sei que nos pensamentos de muitos adultos as pessoas de quem começamos a gostar e nos afeiçoamos quando somos ainda uns bebés são as pessoas de quem mais depressa nos esquecemos; que simplesmente serviram para brincar connosco às casinhas, aos médicos, às lojas de roupa, às mercearias, que simplesmente serviram para aprender coisas novas connosco: coisas fúteis, ou coisas que nos irão acompanhar até ao final das nossas vidas como o aeiou. mas a maior parte dessas pessoas são com as quais formamos um vínculo eterno que irá predominar até ao final das nossas vidas. algumas afastam-se de nós quando ainda somos novos, vão-se embora da nossa terra, ou vão para outra escola... outras continuam bem junto a nós, durante anos a fio, a assistir a todas as nossas evoluções, desgraças, sortes e azares.
muitas das pessoas que conheci enquanto tinha 3 anos (e até menos), ainda hoje tendo eu 16 anos, continuam comigo. acompanharam-me durante estes 13 anos em todas as circunstâncias e não me deixaram ficar mal. como normal, tenho os mais importantes, as mais importantes, mas são todos muitos especiais para mim, e é para todos que escrevo este texto.
tivemos os nossos momentos bons e maus, as nossas discussões, as nossas faltas de consenso. tivemos os nossos momentos tristes quando tivemos de nos despedir de um elemento do nosso grupo, chorámos, gritámos, desesperámos. mas mantemo-nos sempre unidos, e a nossa ligação nunca se desvaneceu. nem o tempo nem a distância a conseguiu partir. pode-se ter suavizado um pouco, porque isso pode acontecer, mas nada conseguiu modificar ou destabilizar a amizade crescente que existe nos nossos corações. existem fios entre nós que não se partem com um pequeno toque ou com o corte de uma tesoura: a nossa amizade é bem mais forte que isso, é indestrutível. no futuro iremo-nos dispersar pelo mundo, vamos deixar de nos falar durante muito tempo, mas tenho a certeza de que nos voltaremos a encontrar, porque a Terra é demasiado pequena para perdermos a nossa amizade assim tão facilmente - ela não é uma agulha que se pode esconder no meio de um palheiro; é mais como... um pneu que tentamos esconder num palheiro de metro por metro. parece impossível, não parece? é porque é.
não concordo que a amizade seja mais forte que o amor, porque os dois estão misturados. sem amizade não há amor, e sem amor não há amizade. as duas estão interligadas consequentemente. e é por isso que tem de haver sempre um pouco das duas na nossa vida, por menor quantidade que seja.
as nossas feições, o nosso corpo, a nossa personalidade, a nossa forma de estar, o nosso modo de agir, os nossos gostos... todos mudam. mas os sentimentos que ficaram mais que decalcados no nosso coração? esses continuarão lá, para todo o sempre. nem que seja preciso uma grande ventania para os podermos estudar tal como fazemos a um fóssil com milhões e milhões de anos. há sempre aquela pontinha solta que fica lá, à espera que a puxemos e vejamos o que quase podemos ter deixado para trás.
mas a vocês, prometo que vou estar sempre aqui e que tentarei sempre estar convosco. vou ajudar-vos em tudo e todas as coisas e esperarei que me ajudem a mim também. vou oferecer-vos o meu ombro, as minhas palavras, as minhas lágrimas, a minha atenção, e esperarei que façam o mesmo. vou amar-vos, e peço-vos que me retribuam esse amor que me faz tanta falta em cada grama de medula óssea do meu corpo.